Sáfadi é diretor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, coordenador da infectologia pediátrica do Sabará Hospital infantil, pesquisador do PENSI e presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Foto: Arquivo pessoal
O desejo de cuidar de outras pessoas acompanha Marco Aurélio Palazzi Sáfadi desde pequeno e foi o motivo principal para que ele optasse pela medicina como profissão. Ele não imaginava, entretanto, que a sua biografia seria regida por um protagonista ainda maior: a saúde pública. O paulista entrou na faculdade aos 17 anos e cursou sua residência e pós-graduação na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Foi no mesmo hospital que ele chefiou o pronto-socorro, a Unidade de Terapia Intensivo (UTI) e foi diretor do Departamento de Pediatria.
“Construí toda a minha história nesse espaço e é onde aprendi o valor da assistência médica mais humana”, diz Sáfadi, que permanece na instituição como diretor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas. Durante sua formação, ele tinha certeza de que trabalharia como clínico geral, atraído pelo desafio diante dos diagnósticos. A escolha pela pediatria veio mais tarde. “Foi uma área que me cativou. Aprendi que as crianças são mais vulneráveis e ao mesmo tempo mais genuínas.”
Além de seu papel na Santa Casa, Sáfadi contribui significativamente para o campo da pediatria no Sabará Hospital Infantil, como coordenador de infectologia pediátrica e pesquisador do PENSI. Trabalhando em parceria com o instituto, ele e sua equipe iniciaram pesquisas em infectologia pediátrica muito antes de a área ganhar destaque devido à pandemia de covid-19. “Nossa equipe vem se dedicando a esse tema há mais de dez anos. O Sabará abriu as portas para muitas conquistas nessa área por ter uma equipe atuante e um trabalho de atendimento interdisciplinar que muitos hospitais até hoje não têm.”
Notícias da Saúde Infantil — A área de infectologia ganhou espaço nesses últimos anos. Como essa mudança impactou o trabalho realizado pelo Sabará e pelo PENSI?
Sáfadi — Formamos uma equipe de especialistas inicialmente pequena no Sabará, mas que é superatuante. Tive a felicidade de trabalhar com colegas muito importantes. Nesse meio-tempo surgiu o zika, logo depois o novo coronavírus e agora estamos diante da dengue. Nossa participação cresceu ainda mais nesse setor porque compreendemos rapidamente que ter uma equipe atuante em parceria com outros especialistas, como os pediatras, faria a diferença. Fomos pioneiros nesse trabalho conjunto e isso fez muita diferença. Mas é importante frisar que quem ganhou mais foram os pacientes atendidos.
Notícias da Saúde Infantil — O trabalho realizado pelo PENSI também rendeu avanços científicos. Para quais você daria mais destaque?
Sáfadi — Durante a covid-19 fizemos diversas pesquisas, publicadas em revistas médicas de alto impacto e com reconhecimento internacional. Entre elas temos os relatos da experiência do Sabará no atendimento das crianças com o novo coronavírus, que está entre os mais importantes dentro do serviço médico brasileiro. Passamos a promover mais palestras e atividades científicas, por exemplo, para atualizar os pediatras sobre as últimas novidades na área e as formas de prevenção dessas enfermidades. Nosso grupo é muito ativo na parte de educação médica. Também temos pesquisas em parceria com o PENSI na área de diarreia, da internação de pacientes e também de uma vacina para meningite. Nós nos orgulhamos de ter conseguido fazer com que o instituto participasse da análise desse imunizante.
Notícias da Saúde Infantil — Qual o grande diferencial dessa nova vacina para meningite comparada com as já existentes?
Sáfadi — Ela é um imunizante que combina vários tipos de meningococos, sendo então mais eficaz para vários subtipos da doença. Em vez de o paciente tomar duas ou três vacinas, ele precisa só de uma para estar protegido de todas as formas da enfermidade. Isso é importante porque pode ajudar na ampliação da cobertura.
Notícias da Saúde Infantil — Por que vocês têm priorizado no PENSI a área de prevenção da bronquiolite?
Sáfadi — Observamos no dia a dia dos atendimentos no Sabará que essa enfermidade sobrecarrega demais os hospitais. Finalmente estão surgindo mais ferramentas para combatê-la, que estarão disponíveis no Brasil ainda este ano. Nosso foco está em duas estratégias: a imunização ativa, que é a vacina aplicada na gestante — ainda no útero, a criança tem a capacidade de produzir anticorpos. A segunda é a imunização passiva, em que se utiliza um anticorpo monoclonal pronto, que você dá para o bebê ainda na maternidade, e isso impede que ele tenha a forma grave dessa doença, desencadeada pelo vírus sincicial.
Notícias da Saúde Infantil — Qual é a sua análise sobre o aumento da dengue no Brasil e o impacto da inclusão da vacinação infantil contra a dengue no SUS para o controle da doença no futuro?
Sáfadi — Tivemos recentemente um encontro com especialistas para discutir as melhores práticas no que diz respeito à criança com dengue. Como atender, melhorar a prevenção e o tratamento. Acredito que o foco atualmente precisa ser nesses pontos. A iniciativa da vacina ainda é tímida; sendo assim, vai demorar para vermos resultados em relação à imunização. O laboratório tem poucas doses para oferecer e por isso o impacto é bem pequeno. Acredito que os efeitos só poderão ser avaliados nos próximos dois anos. Os casos de dengue ocorrem em todas as faixas etárias; assim, também é necessário alertar a população para as maneiras de prevenir, priorizando principalmente o combate ao mosquito, o vetor da enfermidade.
Notícias da Saúde Infantil — Como você avalia o atual cenário da pesquisa em vacinas no Brasil e quais são suas expectativas para o desenvolvimento nessa área nos próximos anos?
Sáfadi — Acho que vale destacar o trabalho do Instituto Butantan, que é de altíssima relevância científica e que está desenvolvendo uma vacina para dengue muito promissora, capaz de gerar alta proteção com apenas uma dose. Caso tenham sucesso, aí sim poderemos ampliar a imunidade para todos os brasileiros. Eu vejo de forma muito positiva esse projeto e acredito que essa vacina poderá beneficiar muito a população.
Notícias da Saúde Infantil — Qual é a sua percepção sobre a situação atual da covid-19 no Brasil e como você prevê sua evolução?
Sáfadi — Durante a pandemia, eu fui uma voz muito ativa para destacar a importância de permitir o retorno das crianças para a escola e da necessidade de realizar esforços para retomada da convivência no ambiente escolar, dando foco principalmente à saúde mental. Essa foi uma das nossas principais batalhas. Hoje o cenário é outro e felizmente a população já tem um grau de imunidade maior em relação a essa doença. Quando somos expostos, isso faz com que a enfermidade se torne mais branda. Atualmente, as mortes estão mais concentradas nos idosos e em pessoas com comorbidades. Mas temos também as crianças pequenas, nos primeiros 24 meses de vida, um grupo que está associado a índices altos de hospitalização. Ao mesmo tempo, elas também mostram uma reação positiva a vacinas, mais que adultos e adolescentes. Por isso é importante uma maior atenção a essa faixa etária.
Notícias da Saúde Infantil — Tivemos problemas no país com o zika vírus, a covid-19 e a dengue, mais recentemente. Arriscaria alguma nova enfermidade que pode merecer mais atenção nos próximos anos?
Sáfadi — O exercício de prever é complicado. Não temos como saber o que vai acontecer, porém já temos noção dos problemas relacionados à dengue e que enfrentaremos uma longa batalha contra ela. Vale destacar também a influenza. São doenças que são alvo de muitas mutações e que por isso podem causar problemas. Caso eu fosse arriscar, meu palpite é que teremos de ter ainda mais atenção com a influenza.
Notícias da Saúde Infantil — Quais são os principais desafios que você antecipa para a saúde pública nos próximos anos e como acredita que eles possam ser enfrentados?
Sáfadi — Eu acredito muito na saúde pública do Brasil. O SUS é um exemplo real de que podemos oferecer proteção à população por meio de um serviço unificado e abrangente. Por isso é necessário fortalecer esse sistema. Melhorar o que é preciso, dar qualidade e apoio aos pacientes. Acredito que as parcerias público-privadas, como fazemos no Sabará, que é um grande parceiro das Santas Casas, por exemplo, podem contribuir muito em busca desse objetivo. São iniciativas importantes e que podem ajudar principalmente na área de educação médica, como no caso das parcerias acadêmicas, e gerar ainda mais resultados positivos, a exemplo do que temos visto nesses anos de trabalho do nosso grupo. A área de pesquisa é essencial e pode fazer muita diferença no combate às enfermidades infecciosas.
Por Rede Galápagos
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