O PENSI se uniu à Fipe-USP numa pesquisa que comparou quanto as famílias com membros com TEA gastam a mais que as famílias típicas. Avaliar o custo social do autismo é fundamental para a proposta de novas políticas públicas
A pergunta é ampla, a resposta idem, até porque nenhuma criança com TEA é exatamente igual a outra. Além dos graus diferentes de autismo, cada criança, cada adolescente, tem sua própria personalidade, suas potencialidades e dificuldades, como qualquer um de nós. O tratamento que funciona para tantas pessoas com TEA pode não funcionar para muitas outras, e isso faz com que as despesas variem um bocado em cada caso.
A estimativa da média dos gastos de uma família com um ou mais filhos com TEA — independentemente se eles usam a terapia X ou a Y — é fundamental para a proposta de novas políticas públicas para o autismo. É preciso mostrar ao poder público, às pessoas que controlam o orçamento, quanto custa para uma criança com TEA se desenvolver. Foi a partir disso que o Instituto PENSI se uniu com especialistas da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) da USP numa pesquisa bem detalhada que comparou quanto gastam as famílias com TEA e as famílias típicas.
“Criamos o que chamamos de estudo caso/controle, com as famílias que têm filhos com autismo, no papel de caso, e as famílias típicas, que não têm TEA, no papel de controle”, conta Denise Cavallini Cyrillo, professora de economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, que coordenou o estudo junto com os professores Helio Cruz e Antonio Carlos Campino. Os resultados revelam como é praticamente inviável o tratamento adequado (incluindo alimentação e transporte, mais a perda da renda quando uma pessoa da família deixa de trabalhar para cuidar do filho com TEA) para a maioria da população brasileira.
Quem participou — A pesquisa foi feita on-line e as famílias que aceitaram participar tiveram de se encaixar nos seguintes requisitos: 1) Ter, no mínimo, um membro com autismo, de idade entre 4 e 21 anos; 2) Morar no estado de São Paulo; 3) Ter renda mínima mensal no valor de 800 reais per capita. Ou seja, uma família com cinco pessoas (por exemplo: pai, mãe e três filhos) deveria ter uma renda mínima de 4 mil reais mensais, mas famílias de várias rendas responderam às questões. Além disso, a pessoa responsável que respondesse ao questionário teria de ser bem organizada, já que eram muitas e detalhadas as perguntas sobre os gastos mensais. Foram enviados mais de 12 mil e-mails-convite para quem quisesse participar. “Foi fundamental a colaboração da equipe do PENSI para localizar as famílias e também ajudá-las a preencher o questionário”, diz o professor Helio Cruz.
No total, 176 famílias responderam a todas as questões, sendo 79 famílias típicas (sem casos de autismo), 57 com filhos com autismo nível 1 e 2 e 40 com filhos autistas nível 3. O questionário foi inspirado num modelo tradicional da Fipe para avaliar orçamentos familiares, que é semelhante ao que o IBGE usa na hora de calcular índices de inflação. “Perguntamos quanto a família gastou com alimentação, transporte, educação, saúde. Dentro do tema saúde, a gente perguntou de quanto foi o gasto com plano de saúde, terapias psicológicas, mas sem esmiuçar quais terapias”, diz Denise. Entre as questões específicas, por exemplo, estavam as despesas com alimentação especial (algo comum entre quem tem autismo, ainda mais o de nível grave) ou com apoio doméstico, como babás. Também entrou nessa conta a renda perdida da família, o que os economistas chamam de custo implícito. É quando uma pessoa (quase sempre a mãe) deixa de trabalhar para cuidar do filho. Ou arruma um emprego com carga horária menor, ganhando menos e sacrificando o orçamento familiar.
O que dizem os números — Os pais que vivem essa realidade já sabem muito bem que as despesas com TEA são astronômicas, mas vistos assim com lupa, dentro do contexto de famílias de vários níveis sociais, os números são impressionantes. Famílias com filhos no espectro autista nível 3 gastam mais do que o dobro do que famílias típicas. Na média calculada entre as diversas famílias pesquisadas, quando se levam em conta a renda perdida e os gastos mensais, uma família com filho com TEA nível 3 pode gastar 1.859 reais mensais per capita a mais do que uma família típica. Isso significa que, se na casa moram, por exemplo, cinco pessoas (pai, mãe e três filhos), os gastos mensais chegam a 9.295 reais a mais do que os de uma família típica.
A situação é ainda mais complicada quando os economistas se debruçam sobre quanto esses gastos consomem do orçamento total da família. “A OMS chama de catastrófico o gasto com saúde que é acima de 20% ou 30% do orçamento familiar”, explica Denise. Pelos dados da pesquisa, quando os cálculos incluem o que se gasta com planos de saúde, as famílias com membros com autismo nível 3 têm um rombo de 36,5% no seu orçamento com saúde. E as famílias com autistas nível 1 e 2 gastam 21,2% do orçamento. Ou seja, estão com os dois pés na “catástrofe”. Nas famílias sem autismo, o índice é bem menor: 12,7%. Esses valores indicam as despesas gerais, de todas as pessoas da família.
Se a gente isolar o gasto exclusivo do filho que tem TEA 3, isso já consome mais de 20,9% do orçamento familiar. Vamos incluir nessa conta também os gastos com alimentação especial só com a criança com TEA: aí o valor sobe para 36% da verba doméstica. Além de todos esses dados alarmantes, o relatório da Fipe é importante para apontar várias sugestões para análises futuras com foco nas políticas públicas. “Uma ideia é avaliar o custo social do autismo para a sociedade brasileira, já que pessoas que têm autismo nível 3 dificilmente serão produtivas”, afirma Helio.
Por Rede Galápagos
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