Instituto PENSI – Estudos Clínicos em Pediatria e Saúde Infantil

Meninos e meninas: “Todo mundo pode ser o que quiser, né?”

Meninos e meninas: “Todo mundo pode ser o que quiser, né?”

Meninos e meninas: “Todo mundo pode ser o que quiser, né?”

Num dos momentos de parque na escola, um menino de 4 anos, vestido com a fantasia da Branca de Neve, se aproxima e me pergunta “Todo mundo pode ser o que quiser, né? Mas não é que quem inventou essas fantasias e roupas de super-heróis pensou que era para um menino?”. Sem que ao menos eu tivesse tempo para verbalizar minha resposta, ele sai correndo e volta à brincadeira. Ele voltou para o mundo do faz-de-conta e eu fiquei com a sua reflexão.

Uma reflexão sobre as questões de gênero na infância. Sobre os estereótipos que vamos afirmando de diversos modos. E com eles limitamos as ações das crianças e a possibilidade de exercerem a sua criatividade. Sim, digo da criatividade, pois para além do ser menino e menina, impossibilitamos que novas brincadeiras sejam criadas e experimentadas pelas crianças. Nós e elas ficamos cegos para todas as cores e ficamos apenas com o rosa e o azul.

Na Casa Ubá recebemos crianças andantes até os 10 anos e ouvimos, em diversas situações, das próprias crianças que certas coisas são para as meninas e outras para os meninos.

“Não quero brincar disso, porque isso é brincadeira de menininha!”

“Ele não pode usar o lápis rosa, porque ele é menino e rosa é de menina.”

“Não vou mais vestir a fantasia da Branca de Neve porque é só para meninas.”

“Meninas não jogam futebol.”

Não se ouve só das crianças, mas também dos adultos em diversas situações, talvez com falas mais sutis sobre o assunto.

“Olha como ela já sabe se sentar que nem mocinha.”

“Desde pequena (um ano e pouco) ela já sabe segurar com tanta propriedade uma boneca.”

Uma menina de um ano e pouco só sabe segurar com tamanha propriedade uma boneca porque lhe deram bonecas de presente. Poderíamos nos perguntar se de fato há uma certa aptidão de nascença para meninos e meninas. Ou então, nos perguntar se ela tem carrinhos. Pois se tivesse seria possível que esta fala fosse um pouco diferente. Do mesmo modo, por que perguntamos para um menino que time ele torce e para as meninas não?

Se pensarmos no que cada brincadeira possibilita para as crianças experimentarem, estamos condicionando e limitando comportamentos, não opções sexuais. A brincadeira com a boneca, por exemplo, traz a questão do cuidado com o outro, tão importante para todos, sejam meninas ou meninos. Do mesmo modo, os super heróis são sempre muito corajosos, característica que entra pouco nas brincadeiras das meninas, o que faz com que quase não experimentem um certo empoderamento.

O menino que me perguntou aquela questão não esperou o meu retorno, pois talvez esta resposta já estivesse bem clara. Aqueles que inventaram as fantasias, sim, pensaram que eram para meninos. Mas inventamos no coletivo. Todos nós inseridos nesta mesma cultura que define papéis masculinos e femininos e que, desde pequenos, impregnamos de sentido as brincadeiras das crianças.

Afinal “Todo mundo pode ser o que quiser?”. Queremos garantir que as crianças possam brincar e experimentar serem o que quiserem ser. Que as cores não sejam esquecidas e possam se misturar.

Leia também: Brinquedos e brincadeiras têm sexo?

Atualizado em 25 de setembro de 2024

Sair da versão mobile