No Ceará, a Expedição Sertões Kitesurf 2024 da SAS Brasil revelou-se uma experiência transformadora para os médicos residentes do Instituto PENSI e do Sabará Hospital Infantil. Na foto, Lívia Grassia Halak com um paciente. Ao fundo, a dra. Luciana Izar. Fotos: Mariana Pimentel/SAS Brasil
No Vale do Acaraú, no extremo oeste do Ceará, famílias batalham para conseguir o acesso à saúde especializada para seus filhos. Quando a cidade de referência mais próxima está a aproximadamente 238 km de distância, soluções para conseguir uma consulta médica são sempre bem-vindas. É nesse cenário que a SAS Brasil conectou os profissionais do Instituto PENSI com a população do Vale do Acaraú.
A interação, que começou por meio das telas, conectou profissionais e pacientes a 3 mil quilômetros, permitindo um acompanhamento integral do desenvolvimento de centenas de crianças. Em outubro, a equipe encurtou a distância com a ida presencial para a região durante a Expedição Sertões Kitesurf 2024 realizada pela SAS Brasil.
As residentes Lívia Grassia Halak e Fernanda Carvalho relatam como foi a experiência da prática pediátrica em um cenário marcado pela escassez de recursos e desafios logísticos. Lívia, representante dos residentes, destacou a expectativa inicial de atender crianças previamente acompanhadas pela telemedicina. “Eu esperava criar vínculos mais sólidos com as famílias que já estavam na linha de cuidado. Mas a realidade foi além: atendemos muitas crianças em demanda espontânea, casos que jamais teriam acesso a um pediatra”, contou.
Fernanda compartilhou sua motivação pessoal, enraizada em experiências anteriores com trabalhos voluntários. “Sempre quis aliar a pediatria à assistência social. Participar dessa expedição foi a realização de um projeto de vida”, afirmou.
O impacto das preceptoras
Para os residentes, a convivência com as preceptoras foi um dos aspectos mais enriquecedores da experiência. “Ver a dra. Luciana e a dra. Regina lidando com casos complexos, mantendo a excelência no atendimento mesmo em condições adversas, nos ensinou que a medicina transcende a técnica. Tem a ver com humanidade e resiliência”, destacou Fernanda.
Fernanda Carvalho com uma paciente de quatro anos durante os atendimentos na Expedição Sertões Kitesurf. A criança foi diagnosticada com obesidade grau 3 e alterações ósseas, sendo encaminhada para tratamento especializado
Durante os atendimentos, a dra. Luciana identificou casos que exigiam atenção urgente, como o de uma menina de quatro anos com obesidade grau 3 e alterações ósseas. “Ela nunca tinha recebido o cuidado especializado necessário. Conseguimos encaminhá-la para tratamento em Fortaleza, o que pode mudar seu curso de vida”, explicou. Para Lívia, essa abordagem integral foi inspiradora: “Elas trataram essas crianças com o mesmo cuidado e dedicação que dedicariam a qualquer paciente no Sabará”.
Aprendizado em campo
A vivência prática impactou profundamente a formação dos residentes. “Enfrentar uma realidade tão diferente da que vivemos no Sabará nos fez repensar o que significa ser médico no Brasil. Foi um choque necessário”, avaliou Lívia.
Fernanda também destacou o aprendizado proporcionado pelos desafios logísticos e estruturais. “Aprendemos a valorizar cada recurso, a improvisar e a encontrar soluções. Isso nos prepara para qualquer ambiente de trabalho, seja no Brasil profundo ou em um hospital de ponta.”
A telemedicina como ferramenta de inclusão
A experiência com a telemedicina, tanto nos dois meses anteriores à expedição quanto durante os atendimentos presenciais, ampliou a visão dos residentes sobre o potencial dessa ferramenta. “A telemedicina rompe barreiras geográficas e oferece um acompanhamento digno, mesmo com limitações”, afirmou Fernanda. Para Lívia, a integração entre consultas virtuais e presenciais é essencial: “Conhecer o ambiente e as condições das famílias ajuda a personalizar as orientações e o cuidado”.
O médico residente Douglas Amaral Mioto examina um bebê durante a expedição: reencontro com pacientes que já conheciam pela telemedicina
Casos marcantes
Entre os atendimentos, Fernanda destacou um bebê com síndrome de Down, diagnosticado inicialmente por telemedicina e avaliado presencialmente durante a expedição. “A família nunca teria conseguido o diagnóstico tão cedo. Foi emocionante ver como essa experiência transformou a vida deles”, relatou.
Outro caso mencionado foi o de crianças diagnosticadas equivocadamente com transtorno do espectro autista, quando eram condições decorrentes do uso excessivo de telas. “Orientar essas famílias sobre brincadeiras e interação foi uma oportunidade de prevenir problemas futuros. Pequenas intervenções podem ter um impacto gigantesco”, acrescentou Lívia.
Reflexões e futuros passos
A experiência despertou reflexões sobre o papel do médico na sociedade. “Somos formados para atuar no Brasil como um todo, não apenas nas grandes capitais. Essa vivência nos mostrou que podemos fazer a diferença, mesmo em condições adversas”, afirmou Fernanda.
Lívia concluiu destacando a importância da continuidade do projeto: “Ter a oportunidade de conhecer essa realidade, trabalhar com nossas preceptoras e fazer parte dessa transformação foi um privilégio. Espero que mais residentes tenham essa experiência”.
Por Rede Galápagos
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