Depois de contar um pouquinho para vocês sobre os benefícios dos livros e sobre a importância de criar esse hábito em família, é hora de uma das partes mais gostosas do processo de leitura: escolher os livros. Mas como fazer isso? Como saber se um livro é bom?
Bem, antes de continuar preciso fazer uma colocação importantíssima: existem dois tipos de “bom”. Um livro que é bom para mim pode não ser bom para você, e vice-versa. É que esse é o “bom” subjetivo, aquele que depende do que há dentro de nós para o livro despertar – ou não – nossas emoções. Esse “bom” depende muito mais de nós do que do livro em si. Ou ele nos toca ou não, dependendo do repertório que a gente carrega.
Mas também existe o “bom” que se refere à qualidade literária: aquele critério que vai definir se o livro é bom para proporcionar a experiência que um livro literário deve proporcionar, que é a do mergulho, da experiência sem pretensões ou didatismos. É sobre esse “bom”, que deve vir antes do outro, que falo aqui. Combinado?
Vamos fazer um paralelo com os filmes: existem os filmes educativos, que as crianças assistem em aula: são filmes que servem para ensinar. E existem os filmes que servem para entreter, que se ensinarem alguma coisa é porque conversaram com algo íntimo dentro de nós – com o nosso repertório – mas sem que essa fosse a intenção do filme. São aqueles filmes feitos como arte. Pois então: com livro é a mesma coisa. Existem os livros didáticos, que vêm para ensinar, e existem os livros literários, aqueles feitos sem nenhuma pretensão a não ser a de nos fazer viajar pela história que o autor quis nos contar. É claro que eles acabam nos ensinando alguma coisa, mas essa nunca é a intenção principal: os livros literários são aqueles que não devem ter uma utilidade clara. Mas o que acontece é que, muitas vezes, livros utilitários vêm disfarçados de literários. Sabe aqueles títulos “Como ser um bom menino”, “Aprendendo a dizer por favor e obrigado” (estou inventando, ok? Qualquer semelhança é mera coincidência). Fuja deles. Esses livros não são literários e esse é o primeiro critério para escolher “bons” livros – literários – que entrem na sua casa única e exclusivamente com a intenção de entreter. Queremos os livros que formam leitores, que são justamente os que não têm cara de lição ou de obrigação.
O próximo passo é entender que, mesmo entre os livros literários, existem diversos gêneros. Para os adultos eles são mais claros: biografias, romances, mistério, ficção científica. Os adultos, em geral, já sabem que tipo de livro gostam de ler e fica mais fácil escolher dentre as categorias. Mas os livros infantis são todos “livros infantis”: um grande gênero que muitas vezes dificulta a escolha. Assim como nós, as crianças também têm preferências: algumas gostam de livros de humor, outras de poesia, outros de contos clássicos ou de repetição, outras de aventuras. Quando a gente vai escolher um filme para nosso filho assistir, a gente pensa nos gostos da criança, não pensa? Com livro também deveria ser assim, e a chance de acertar aumenta muito. Pense: seu filho gosta de bichos ou de fadas? É uma criança que gosta de filosofar ou é uma criança que gosta de rir com piada de pum? Existem livros para todos os gostos e escolher pensando no perfil da criança, e não somente nos básicos gênero e idade, é uma forma de levar a sério essa criança leitora, respeitá-la.
É legal também avaliar a qualidade física do livro. Květa Pacovská, uma grande ilustradora tcheca, uma vez disse que o livro é o primeiro museu de uma criança. Ou seja: o livro é o primeiro contato que as crianças têm com a arte. Pense nisso na hora de avaliar visualmente uma obra: o papel é bom, a impressão é bem-feita? Ela traz desenhos “pasteurizados”, aqueles sem traços originais, que se parecem com os desenhos da televisão, ou ela traz estímulos que vão enriquecer o repertório da criança, com técnicas de desenho e pintura, traços autorais, colagens? Quanto mais isso variar na biblioteca de casa, mais rica será a experiência.
Por fim, mas não menos importante: se estamos falando de formar leitores, tão importante quanto a qualidade do livro é associar a leitura ao afeto, à formação de laços: ler junto com ou para a criança. E para que isso funcione da melhor forma possível, o adulto também gostar do livro é fundamental: afinal, um livro para crianças que só é bom para crianças não é um bom livro.