Instituto PENSI – Estudos Clínicos em Pediatria e Saúde Infantil

Um aumento gigantesco nos diagnósticos de problemas alimentares na infância e adolescência: mito ou realidade?

Nos últimos anos, temos visto uma tendência de crescimento no número de casos de crianças e adolescentes com transtornos da alimentação, com diagnósticos crescentes de anorexia nervosa, bulimia, compulsão alimentar, comer compulsivo noturno e outros problemas relacionados ao controle da alimentação e com a autoestima e imagem corporal modificada.

Alguns autores sugerem que os modismos, as campanhas editoriais e a moda, mostrando modelos cada vez mais magros, possam determinar gatilhos para o início do problema. Dietas exageradas e o combate maciço à obesidade dentro das casas, poderiam indicar um caminho que alguns adolescentes podem trilhar, perdendo o que chamamos de termômetro do peso.

Se por um lado temos o aumento contínuo do excesso de peso e da obesidade em todo o mundo, alcançando cada vez mais crianças e adolescentes, em todos os meios sociais e econômicos, do outro vemos uma tendência importante de alguns segmentos a adotarem dietas cada vez mais rígidas, restritivas e a tentativa de se alcançar um corpo perfeito.

Influenciadores, artistas em órgãos de comunicação e, às vezes, até profissionais de saúde determinam rumos para que o corpo humano seja quase que homogeneizado, com cabelos lisos, cílios gigantescos, lábios inchados e corpos sarados para ambos os sexos.

Imagino a confusão para uma criança ou um adolescente, vivendo em um ambiente em que a comida é a principal obsessão, tanto para a ingestão desenfreada, como para um controle excessivo do peso, e que fica na dúvida entre um corpo impossível e a pressão da sociedade para maior consumo, maior ingestão de alimentos práticos, rápidos e mais calóricos e dietas – quase sempre – de sucesso improvável.

Outra corrente de pesquisadores acha que o aumento dos casos de transtornos alimentares deve-se não a um processo de gatilhos, mas ao aumento dos diagnósticos, com maior atenção dos profissionais de saúde e dos próprios pacientes, com testes mais adequados e ferramentas mais sensíveis de diagnóstico.

Entre os diagnósticos ainda não caracterizados como doenças psiquiátricas, vemos o aumento dos comportamentos excessivos para alcançar a saúde. A vigorexia (busca compulsiva de um corpo adequado por meio do exercício físico) e a ortorexia (busca compulsiva pela saúde, independente do meio utilizado) são problemas cada vez mais comuns em adolescentes e adultos jovens.

Em crianças e em adultos, um diagnóstico recente tem sido cada vez mais popular, sendo aventado por profissionais de saúde ou até mesmo nas redes sociais, com centenas de milhares de adeptos. O Transtorno Alimentar Evitativo Restritivo ou TARE ou ARFID para a sigla em inglês, tem sido um termo extremamente buscado na internet, para tentar dar um nome para crianças ou adultos com seletividade alimentar extrema. O termo, cunhado por psiquiatras americanos, em sua classificação internacional de doenças – o DSM-V (diagnósticos de saúde mental em sua quinta edição), tem uma norma muito específica para o diagnóstico da doença, com importante alteração do estado nutricional e do funcionamento psicossocial do paciente. Não é o caso da maioria dos pacientes que recebemos com este diagnóstico, sendo que são, na verdade, estágios anteriores das doenças ou seletividade alimentar importante. Nem sempre com angústia, sofrimento ou alteração do estado nutricional, mas sempre com grande ansiedade dos pais ou dos profissionais da saúde.

É extremamente importante que pais, cuidadores, escolas e profissionais da saúde estejam atentos aos problemas alimentares das crianças e adolescentes, mas que tenham olhos abertos para os diagnósticos corretos e, quando necessário, o encaminhamento para profissionais especializados em clínicas multidisciplinares.

Não devemos permitir que a imagem corporal e o ideal de vida sejam ditados por influenciadores, que as custas de curtidas ou retorno econômico, orientem o estilo de vida, o tipo de corpo e a imagem que nossas crianças e adolescentes devem buscar ou apresentar. Com isto, talvez, tenhamos uma reversão nas tendências de crescimento de problemas alimentares de gravidade em nosso meio.

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