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A guerra fere os mais jovens de maneira duradoura
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A guerra fere os mais jovens de maneira duradoura

A guerra fere os mais jovens de maneira duradoura

24/03/2022
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A insensatez humana que temos visto pela TV nas últimas semanas, com as imagens de uma guerra insana onde já morreram inúmeras crianças e outras tantas ficaram sem seus pais, por si só já é um sofrimento que fere fundo a alma de qualquer ser humano.

Crianças, principalmente as menores, são mais suscetíveis às turbulências e inseguranças do ambiente, já escrevi sobre isso falando de tiroteios em comunidades do Rio de Janeiro. A convivência com a violência por um tempo prolongado estabelece uma condição que chamamos de estresse tóxico. O estresse tóxico tem impactos significativos e mensuráveis nos níveis molecular, celular e comportamental, é difícil de tratar e tem impactos profundos e duradouros.

Uma das tristezas e realidades dos tempos modernos é a facilidade com que qualquer pessoa pode testemunhar o preço global do sofrimento experimentado por crianças pequenas em meio a grandes eventos mundiais. As redes modernas de coleta de notícias e as mídias sociais tornam muito difícil “apenas desviar o olhar” – nem devemos.

Já li sobre dezenas de crianças mortas, atravessando fronteiras sozinhas e vi uma imagem chocante de uma grávida morta em um bombardeio em Kiev. Embora seus pais possam tê-las enviado para alcançar a segurança física, longe do ataque russo ao seu país, elas não estão completamente seguras. Muitas aparecem soluçando, aparentemente sozinhas, sem conforto – e, claramente, traumatizadas psicologicamente.

Não são histórias isoladas. Segundo as Nações Unidas, mais de 2 milhões de pessoas fugiram da Ucrânia em apenas 12 dias, e cerca de meio milhão delas são crianças. Crianças sozinhas, em busca de segurança e proteção, é uma ocorrência muito frequente. Nos últimos anos, vimos isso na Síria e no Iêmen, e também testemunhamos crianças deixadas sozinhas na fronteira dos EUA com o México. Para cada pequeno desacompanhado, há pais que podem ser presos, incapazes de encontrar sua família ou mortos.

Há evidências amplas e sólidas do impacto negativo de crianças pequenas serem separadas de seus pais e outros cuidadores. Além de tornar os aspectos práticos da criação dos filhos muito mais desafiadores, o próprio fato da separação é um golpe direto e devastador para o que é chamado de saúde relacional, a saúde do relacionamento entre pais e filhos. É bastante claro que todas as crianças precisam de relacionamentos seguros, estáveis ​​e estimulantes para se desenvolverem normalmente, quanto mais florescer e prosperar.

Os recentes conflitos armados no mundo têm consequências que nem sempre são discutidas ou levadas em consideração. Fica claro que o fato de que a guerra, a revolta e o caos impedem, prejudicam e, em alguns casos, destroem permanentemente esses relacionamentos tão importantes para crianças notavelmente pequenas. Embora as crianças mais velhas também sofram perturbações – em sua educação, saúde mental e muito mais – crianças menores de 5 anos têm capacidade de desenvolvimento limitada para entender o que está acontecendo ou compreender a ausência ou o afastamento de um cuidador familiar. Além disso, as crianças pequenas construíram apenas uma capacidade limitada de usar estratégias de enfrentamento de nível superior para esses desafios extraordinários, resultando no que chamamos de estresse tóxico.

Esses fenômenos não conhecem limites no tempo e no espaço e afetam crianças de todas as origens, etnias, religiões, continentes e idiomas, tanto agora quanto no passado. Não podemos ignorá-los, onde e quando ocorrerem.

Devemos reconhecer que as crianças pequenas podem ter esses relacionamentos fraturados de várias maneiras. Elas podem ser separadas de seus cuidadores em meio à guerra ativa, elas podem ser enviadas para a segurança física enquanto um dos pais permanece para lutar.

Um adulto pode ser preso por exercer seu direito de liberdade de expressão sobre uma situação. Um pai pode ser morto ou traumatizado psicologicamente de uma maneira que impede a sua capacidade de mostrar o seu amor. Temos que enfatizar o quão abrangente a ameaça pode ser em todas as partes do planeta.

Cabe a nós, organizações como a Fundação José Luiz Egydio Setúbal, falar por essas crianças que vivem na insegurança de uma guerra real, ou de uma emigração forçada, ou de uma comunidade violenta, ou de uma situação de insegurança alimentar e pedir aos nossos líderes que promovam não só a PAZ entre os homens, mas também que façam uma verdadeira batalha contra a DESIGUALDADE. Talvez assim possamos construir um mundo realmente melhor para todos.

Saiba mais:

Dr. José Luiz Setúbal

Dr. José Luiz Setúbal

(CRM-SP 42.740) Médico Pediatra formado na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, com especialização na Universidade de São Paulo (USP) e pós-graduação em Gestão na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Pai de Bia, Gá e Olavo. Avô de Tomás, David e Benjamim.

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