Instituto PENSI – Estudos Clínicos em Pediatria e Saúde Infantil

Família Acolhedora: uma resposta possível para o abandono de crianças no Brasil?

“Um menino caminha
E caminhando chega num muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente o futuro está

E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença, muda a nossa vida
E depois convida a rir ou chorar.”

Quem nunca foi embalado pelas composições e pelo som da voz e do violão de Toquinho? Aquarela, A bailarina, O caderno, Tarde em Itapuã, É bom ser criança… Tantas canções na memória de muitas gerações. A criança musicada de Toquinho é uma criança com direitos protegidos e defendidos. E é exatamente o que precisamos garantir às 8.891 crianças, entre zero e dois anos, que estão em medida de proteção no Brasil. Estas crianças, uma vez afastadas do convívio familiar de origem, são encaminhadas para Serviços de Acolhimento Institucional ou Familiar.

O acolhimento é uma medida de proteção prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), aplicada quando todos os recursos de manutenção da criança e do adolescente em sua família de origem se esgotam. Com duração máxima de 18 meses, o acolhimento se dá quando constatado abandono, negligência e violência que configuram uma violação de direito ou, em casos de entrega voluntária, quando a mãe conclui que não tem condições psicossociais para cuidar de sua criança.

Mais de 95% das 31 mil crianças e adolescentes – de zero a 17 anos e 11 meses – em medida de proteção estão em serviços de acolhimento institucional (abrigo institucional, casa de passagem, casa lar). Cerca de 5% estão em famílias acolhedoras – modalidade onde o acolhimento acontece nas residências de famílias voluntárias vinculadas ao serviço ou programa.

Os professores e pesquisadores Nelson, Fox e Zeanah (2014) realizaram um amplo estudo com crianças que foram institucionalizadas em Bucareste, na Romênia. O estudo mostrou que, para cada ano que passa em uma instituição, uma criança perde quatro meses do seu desenvolvimento global. De acordo com o estudo, apego desorganizado, raciocínio abaixo da média, depressão e TDAH são algumas das consequências da institucionalização. Isso se dá uma vez que certas expectativas fundamentais ao desenvolvimento – conforto, diálogo, cuidado, estímulos e afeto – não são atendidas. Assim, a falta de experiências humanas reais afeta o curso do desenvolvimento do cérebro e, consequentemente, todo o desenvolvimento infantil.

O Acolhimento em Família Acolhedora garante à criança separada de sua família de origem, o direito à preservação dos vínculos parentais, convivência familiar e comunitária, atenção individualizada, construção de relações de afeto e a constância dos cuidados – fator essencial para o desenvolvimento integral saudável de crianças e adolescentes.

Para Charles Zeanah, professor de psiquiatria e pediatria e diretor do Instituto da Criança da Universidade de Tulane (EUA), quanto antes uma criança em medida de proteção for para uma família acolhedora, melhor será para o seu desenvolvimento – o tempo e o momento da intervenção contam neste processo. As crianças advindas de contextos difíceis podem se recuperar de forma significativa em um ambiente familiar, já que as respostas ambientais que se operam nos abrigos institucionais nem sempre correspondem às necessidades reais das crianças.

Acreditamos que toda criança carrega dentro de si uma tendência inata a crescer. Esta tendência está intimamente ligada a oferta de cuidado e proteção nos estágios iniciais da existência humana, pois é neste período que as bases da personalidade, do desenvolvimento cognitivo e motor estão sendo construídas. Cuidado e proteção, viabilizados por um ambiente facilitador, conduzem a criança à aquisição de um futuro promissor.

Texto em colaboração com a equipe do EI-3 Project, Santa Fé & Lalec.

 

Saiba mais:

www.santafe.org.br/programa-familia-acolhedora/

www.lalec.com.br/familia-acolhedora

Sair da versão mobile