A dra. Luciana Izar (à direita), com a residente Fernanda Carvalho, durante triagem de pacientes no Ceará: “Os residentes viram que a pediatria vai muito além das consultas em um consultório bem equipado”. Foto: Mariana Pimentel/SAS Brasil
Em uma região do Ceará marcada por uma escassez crítica de pediatras e de acesso a cuidados especializados, a Expedição Sertões Kitesurf 2024 da SAS Brasil, trouxe alívio e esperança para centenas de crianças e suas famílias.
Juntamente com a dra. Flávia Calanca, coordenadora médica da linha de cuidado Materno Infantil da SAS, estiveram entre os protagonistas dessa jornada a dra. Regina Harue Yada Leite, a dra. Luciana Izar, e o dr. Luiz Guilherme Florence, preceptores do Instituto PENSI, que lideraram médicos residentes em uma vivência transformadora. Em conversa com a newsletter Notícias da Saúde Infantil, elas refletem sobre as lições dessa expedição e o impacto na formação de pediatras.
A jornada de ensino e aprendizado
“Essa expedição foi principalmente um exercício de como ensinar — e aprender — empatia, resiliência e uma visão mais ampla do que significa ser médico no Brasil”, refletiu a dra. Regina, neonatologista e preceptora dos programas de Pediatria Geral e Emergência Pediátrica. Ela explicou que, antes mesmo da viagem, os residentes já vinham acompanhando pacientes desses locais, em consultas por telemedicina, mas o contato presencial foi um divisor de águas.
A dra. Luciana Izar, endocrinologista pediátrica e especialista em distúrbios metabólicos, complementou: “Ver a realidade das famílias e o impacto que um atendimento pode ter na vida delas mostrou aos residentes que a pediatria vai muito além das consultas em um consultório bem equipado”.
Carências e outros desafios
O trabalho presencial começou em Acaraú, na zona litorânea cearense. “Chegamos a uma realidade de extrema carência. Muitos pais relataram que os filhos só recebiam cuidados médicos em casos de emergência, e ainda assim enfrentavam dificuldades”, explicou a dra. Regina. A pediatra detalhou como foi necessário improvisar para organizar atendimentos, desde a falta de instrumentos básicos até a adaptação a um fluxo intenso de pacientes que buscavam pediatria sem agendamento prévio.
A dra. Luciana destacou a questão da alimentação como um dos pontos mais críticos. “Embora muitas crianças tenham acesso a frutas e legumes, o consumo de alimentos ultraprocessados e ricos em açúcar é alarmante. Tivemos uma oportunidade única de orientar as famílias sobre prevenção e hábitos saudáveis.”
Casos marcantes e impacto direto
Um dos casos mais emblemáticos foi o de uma menina de quatro anos, em Acaraú, que sofria de obesidade grau 3 e apresentava alterações ósseas graves. “Quando percebi que ela mal conseguia caminhar, soube que precisávamos agir rapidamente”, contou a dra. Luciana. A menina foi encaminhada ao Hospital Albert Sabin, em Fortaleza, onde iniciou tratamento para uma condição metabólica rara. “Saber que ela agora terá o acompanhamento necessário é o maior ganho dessa expedição.”
A dra. Regina relatou outro caso que emocionou a equipe: o de um bebê com síndrome de Down, inicialmente diagnosticado por telemedicina. “O momento em que entregamos os resultados presencialmente foi indescritível. A mãe estava muito abalada, mas agradeceu profundamente pela nossa presença e pelo acolhimento que recebeu”, lembrou a pediatra. Uma das residentes, Lívia Grassia Halak, participou ativamente no caso do bebê com síndrome de Down. “Ela acompanhou cada etapa do atendimento, da teleconsulta até a entrega do diagnóstico presencial. Foi emocionante ver seu envolvimento”, destacou a dra. Regina.
Uma nova perspectiva para os residentes
A expedição foi uma aula prática intensa para os residentes. “Eles saíram da realidade do Sabará, um hospital com todos os recursos, para uma situação muito diferente, onde era preciso improvisar desde o início”, destacou a dra. Regina. A convivência em campo, segundo ela, revelou o potencial de cada residente: “Eles mostraram criatividade, resiliência e vontade de fazer a diferença”.
A dra. Luciana compartilhou o impacto das conversas que teve com os residentes após os atendimentos: “Eles comentaram como foi transformador ver o paciente como um todo, considerando o contexto social e ambiental, além dos sintomas”.
Telemedicina e a formação médica do futuro
As preceptoras também enfatizaram o papel crucial da telemedicina no projeto. “A telemedicina permite um acompanhamento constante, mas é essencial que haja contato presencial para consolidar o vínculo com as famílias e ajustar os tratamentos”, explicou a dra. Luciana.
A dra. Regina apontou que a formação dos residentes precisa incluir habilidades específicas para consultas virtuais. “É um formato que exige uma comunicação clara e a capacidade de interpretar sinais à distância, o que não é trivial”, observou.
Reflexões e desdobramentos
Para as preceptoras, a Expedição Sertões Kitesurf 2024 foi um catalisador para reflexões mais profundas sobre saúde pública e formação médica. “A experiência reforçou que é possível fazer muito, mesmo com poucos recursos, desde que haja comprometimento e trabalho em equipe”, afirmou a dra. Regina. A dra. Luciana destacou que a continuidade do projeto é essencial. “A cada criança atendida, cada residente que vivenciou essa experiência leva adiante a missão de transformar vidas e promover uma saúde mais equitativa.
A coordenadora da SAS Brasil, dra. Flávia destaca o impacto que a parceria entre a organização social com o Instituto PENSI amplia não só o acesso à saúde, mas também o futuro dos profissionais de saúde que estão sendo formados. “A parceria SAS Brasil e Instituto PENSI, vem unir esforços e potencializar o acesso destas comunidades ao pediatra. É através deste tipo de parceria, com instituições renomadas e profissionais qualificados, que podemos ampliar o que fazemos, aumentando o alcance dos nossos sonhos. É incrível poder ver o engajamento, a dedicação e o profissionalismo da equipe de preceptores e residentes do PENSI, tanto na tela como na terra. Espero que a semente que está sendo plantada, cresça e gere novos agentes de transformação, para que possamos mudar a história do acesso à saúde no Brasil” ressalta a pediatra.
Por Rede Galápagos
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