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Frutas são parte da alimentação desde os primórdios do ser humano na terra. Colhidas no pé ou do chão, são alimentos que fazem parte do processo do prazer – fornecendo o sabor adocicado, muito antes do açúcar. A frutose, açúcar natural das frutas, assim como outros carboidratos presentes na composição dos diferentes frutos, modificam o sabor de outros alimentos da história do homem, como parte de pães, biscoitos, bolos e doces.
Seria fácil dizer que por causa de uma fruta o ser humano perdeu o paraíso. Talvez a maçã não seja a mais doce das frutas, mas o simbolismo existe.
As frutas só passaram a ser consumidas de forma rotineira com o plantio organizado em pomares. Isto permite que o fruto seja produzido, armazenado e distribuído para grandes grupos não produtores. No entanto, há poucas referências sobre a forma com que consumíamos frutas inicialmente. A papa é uma forma comum de uso para todos os alimentos, inclusive em adultos, que somente nos últimos séculos utilizam talheres e o consumo de alimentos sólidos ou consistentes. Modificar frutas para uso em condições de clima adverso determinou o uso de compotas, geleias e cremes. Quase sempre conservados no açúcar, em potes fechados. A modificação para a forma líquida, com o uso de caldos ou sucos, com água ou pura fruta, é bastante relacionada ao consumo de produtos para hidratação em presença de doenças ou para crianças.
Com a urbanização e a difusão de maiores conhecimentos sobre a necessidade de uso de produtos frescos para manutenção da saúde, as frutas, especialmente as cítricas, ganham importância, a partir das pesquisas da marinha inglesa, que mostravam que estas protegiam os marinheiros do escorbuto (descoberta posterior que era causada pela deficiência de vitamina C).
Sabe-se que os sucos naturais são fontes de vitaminas provenientes das frutas, principalmente de vitamina C, um potente antioxidante que regula o sistema imunológico (defesas) e ajuda na absorção do ferro presente nos alimentos. Entretanto, ao contrário da fruta inteira, o suco apresenta maior quantidade de água e carboidratos, que são açúcares naturais do suco como: frutose, glicose, sacarose, sorbitol. Fazer com que as crianças comam frutas em pedaços muitas vezes não é tarefa fácil; os sucos de fruta, saborosos e adocicados, entram no lugar da fruta com muita frequência e maior aceitação pelas crianças.
Nos últimos anos houve aumento da ingestão de suco pelas crianças e paralelamente também aumento de peso; muitos autores começam a relacionar o excesso de peso de crianças ao consumo de bebidas adoçadas, entre elas o suco de frutas artificial. Este cenário levou os especialistas a publicarem orientações e recomendações para o consumo de bebidas, classificando os sucos 100% de frutas no mesmo grupo de outras bebidas açucaradas, como refrigerante e sucos artificiais ou processados.
Recentemente, a Sociedade Americana de Pediatria publicou um anúncio oficial com a recomendação de não oferecer suco de frutas para crianças menores de 1 ano de idade, afirmando que os estudos não mostram benefícios nutricionais em oferecer sucos aos bebês. Antes de discutir as recomendações, é importante entender que:
É consenso que os sucos adoçados devem ser evitados, independentemente da faixa etária. Quanto aos sucos 100% de frutas, a principal desvantagem em relação às frutas inteiras está na facilidade de consumo que favorece a oferta em volumes excessivos, a qual, por sua vez, acaba prejudicando a variedade da dieta, favorece o surgimento de problemas de saúde, como o excesso de peso, obesidade e cáries dentárias.
As crianças devem ser estimuladas a comer a fruta inteira, já que para os bebês especialmente, o suco não estimula a mastigação e pode até atrapalhar a aceitação de alimentos sólidos, pois pecam na experiência com cores, texturas e paladar. Além disso, dependendo do preparo, o suco perde as fibras naturais da fruta e seus benefícios, como a regulação do trânsito intestinal, saciedade e a diminuição da absorção de açúcares e gorduras.
Segue abaixo uma coletânea das recomendações de diretrizes nacionais e internacionais quanto à oferta de suco de frutas:
Sociedade Brasileira de Pediatria – Brasil
• Até 6 meses: não recomenda sucos naturais.
• Após 6 meses: devem ser evitados, mas se forem oferecidos, que sejam dados no copo, de preferência após as refeições principais em dose máxima de 100 ml/dia.
• Crianças de 1 a 6 anos: máximo 150 ml/dia
• Crianças e adolescentes de 7 a 20 anos: máximo 240 ml/dia
Academia Americana de Pediatria – EUA
• Até 6 meses: não recomenda suco
• Até 1 ano: evitar a ingestão de suco
• Crianças de 1 a 3 anos: até 120 ml/dia
• Crianças de 4 a 6 anos: até 175 ml/dia
• Crianças e adolescentes de 7 a 18 anos: máximo 250 ml/dia
National Health Service (NHS) – Reino Unido
• Até 6 meses: não recomenda sucos naturais.
• Após 6 meses: sucos de frutas diluídos (1 parte de suco para 10 partes de água) podem ser oferecidos com as refeições, sucos 100% de fruta apenas após as refeições em pequenas quantidades.
• A partir dos 5 anos: máximo 150 ml/dia.
Health Canada – Canadá
National Health and Medical Research Council – Austrália
• Até 1 ano: não recomendam sucos naturais.
• Depois de 1 ano: dar suco de forma limitada e não oferecer bebidas adoçadas.
Na prática:
– Para fazer 100 a 120 ml de suco natural, são necessárias pelo menos duas laranjas. E é muito pouco provável que um bebê coma essas mesmas duas laranjas inteiras de uma só vez, não é mesmo?
Na fruta inteira, há menos calorias e muito mais fibras! Em porção menor!
Então, a recomendação geral é que os sucos sejam oferecidos após os seis meses de idade de forma limitada, dando sempre preferência às frutas inteiras. As quantidades adequadas e os benefícios do suco para casos específicos devem ser discutidos com o pediatra e nutricionista. Nos intervalos das refeições, o ideal é oferecer água à vontade para que a criança não sinta necessidade de ingerir líquidos na hora de comer.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fruit Juice in Infants, Children, and Adolescents: Current Recommendations
Melvin B. Heyman, Steven A. Abrams, SECTION ON GASTROENTEROLOGY, HEPATOLOGY,AND NUTRITION, COMMITTEE ON NUTRITION. Pediatrics Jun 2017, 139 (6) e20170967; DOI: 10.1542/peds.2017-0967.
HEALTH CANADA. Infant Nutrition. Disponível em: <https://www.canada.ca/en/health-canada/services/infant-care/infant-nutrition.html> Acesso em: 05 de abril de 2017.
NATIONAL HEALTH AND MEDICAL RESEARCH COUNCIL. Infant Feeding Guidelines. Canberra: National Health and Medical Research Council, 2012.
NATIONAL HEALTH SERVICE. Drinks and cups for babies and toddlers. United Kingdom. Disponível em: <http://www.nhs.uk/conditions/pregnancy-and-baby/pages/drinks-and-cups-children.aspx#close> Acesso em: 05 de abril de 2017.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Manual de orientação para a alimentação do lactente, do pré-escolar, do escolar, do adolescente e na escola/Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de Nutrologia, 3ª. ed. Rio de Janeiro, 2012. 148 p.
Centro de Dificuldades Alimentares do Instituto PENSI – Sabará Hospital Infantil
Priscila Maximino
Nutricionista pesquisadora do Centro de Dificuldades Alimentares do Instituto PENSI – Sabará Hospital Infantil. Mestrado e especialização pela Unifesp e pós-graduação em pesquisa clínica. Formação internacional em nutrição em pediatria e dificuldades alimentares. Nutricionista da Nutrociência, docente da pós-graduação do Hospital Israelita Albert Einstein.
Link para Lattes: http://lattes.cnpq.br/7206621535868937
Leticia Ribeiro
Nutricionista do Centro de Dificuldades Alimentares do Instituto PENSI – Hospital Infantil Sabará. Graduada em Nutrição e Metabolismo pela FMRP-USP; aprimoramento em Nutrição em Saúde Pública pela FSP-USP, e especialização em Nutrição Clínica em Pediatria pelo HCFMUSP.
Mauro Fisberg
Pediatra, Coordenador do Centro de Nutrologia e Dificuldades Alimentares do Instituto Pensi- Hospital Infantil Sabará. Professor Associado Doutor do Setor de Medicina do Adolescente do departamento de Pediatria da Escola Paulista de Medicina- UNIFESP. Coordenador da Força Tarefa Estilos de Vida Saudável ILSI Brasil. Diretor da Nutrociencia Assessoria em Nutrologia.
Atualizado em 23 de outubro de 2024