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Há alguns anos assisti o filme “Bebês” (2010), um documentário que mostra o primeiro ano de vida de quatro bebês que nasceram em lugares diferentes do mundo. Ficou muito marcada na minha memória a forma como cada família lidava com o choro das crianças. Simplificando, uma acolhia imediatamente e fazia de tudo para o bebê parar de chorar; outra olhava de longe e continuava a fazer o que estava fazendo, deixando o bebê chorar.
Lembro-me também de quando trabalhava em escolas e discutíamos sobre o imediatismo da nossa ação quando uma criança começa a chorar. E aqui acho importante distinguir o choro provindo de um machucado mais intenso, que requer nosso cuidado às vezes imediato, do choro provindo de um conflito, ou de uma frustração.
Na semana passada tivemos um encontro na Ubá com mães e pais para conversar sobre frustração e apareceu na fala de algumas pessoas a questão do que fazer quando a criança chora quando vive alguma situação em que não foi possível fazer o que ou como ela queria. Alguns relataram que tentam distrair as crianças daquele choro, trazendo-lhe um brinquedo, cantando uma música, entre outras ações. Por que fazemos de tudo para que as lágrimas cessem logo? Uma das mães logo disse: “mas ela está sofrendo.”
É importante refletirmos sobre o que estamos comunicando à criança quando distraímos ela do próprio choro. Afinal, vivemos numa época em que sabemos que expressar os sentimentos é bom: às vezes são risos, às vezes lágrimas. Se tentamos fazer com que a criança pare de chorar a qualquer custo, não estamos comunicando o mesmo do que quando dizem: “Não precisa chorar”? Chorar, sorrir, esbravejar não é de precisar, é de sentir.
As crianças precisam poder chorar e talvez nesse momento o melhor que podemos fazer seja acolhê-las. Como? Isso depende muita da criança que ali está. Algumas gostam de um abraço, outras preferem estar sozinhas por alguns minutos. O nosso silêncio pode ser muito acolhedor. E às vezes basta dizer: “Estou aqui se você quiser ajuda, ou um colo.” Com os pequenos podemos também emprestar palavras: “Você está com raiva porque não pôde tirar o sapato?”, “Você está triste porque seu pai não veio buscar?”. Nomear os sentimentos ajuda a entenderem o que estão sentindo. Fica o convite para repensarmos nossas ações quando as crianças choram, um convite para experimentarmos acolher e respeitar esse choro, mesmo que isso signifique deixar a criança chorar o tempo que lhe for necessário.
Além disso, fica o convite para nos olharmos: o que sentimos quando as crianças choram? Por que ficamos tão aflitos e agimos muitas vezes com imediatismo e querendo que elas parem o mais rápido possível?
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Por Lilia Standerski, formada em Pedagogia pela Universidade de São Paulo. Trabalhou muitos anos como professora de Educação Infantil e cursou Pós-Graduação em Educação Lúdica no ISE Vera Cruz. Em agosto de 2015 abriu, junto com uma colega, a Casa Ubá (www.casauba.com.br), um lugar que desenvolve tempo e espaço para as crianças ampliarem a capacidade de compreender a si mesmas e aos outros por meio de brincadeiras e investigações que surgem nos encontros.
Atualizado em 31 de outubro de 2024