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A esperança por um fio
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A esperança por um fio

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27/12/2017
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“Como a vida muda. Como a vida é muda. Como a vida é nuda. Como a vida é nada. Como a vida é tudo. Tudo que se perde mesmo sem ter ganho.”

Carlos Drummond de Andrade em “Parolagem da Vida”

Como as palavras fluem fáceis quando vindas do nosso “poeta maior”. “A vida é nada. A vida é tudo”. O poder de síntese de Drummond nos leva a uma reflexão: A vida é tão passageira, vale mesmo lutar por ela? Eu não acho que vale, eu tenho certeza!

Alguns meses atrás participei de um fórum de discussões em Bioética, promovido pela Fundação José Luiz Egydio Setúbal. Os temas abordados não eram de meu cotidiano, por mais que eu já tivesse ouvido alguma coisa sobre o assunto, meus conhecimentos eram parcos, e ainda os são, mas me sensibilizaram a ponto de mexer muito com meu âmago. Os temas eram sobre Cuidados Paliativos na infância.

Cuidado Paliativo é uma abordagem que melhora a qualidade de vida da pessoa que enfrenta problemas associados a doenças que ameaçam a vida e, por conseguinte a vida de sua família. É um termo que se associa a palavras fortes: dor, sofrimento, terminalidade, luto. Mas sobretudo traz também em sua essência a luta pela vida e por um sentimento que devemos acreditar sempre, a ESPERANÇA. Mesmo que essa esperança esteja presa a um fio muito tênue que a qualquer momento pode se romper.

Alguns dias depois recebi um telefonema de uma das palestrantes do fórum, a Dra. Regina. Ela pediu para eu avaliar uma criança que estava internada na UTI do Hospital Infantil Sabará. A criança apresentava uma doença crônica, de prognóstico desanimador, que não se alimentava. A criança tinha dentes de leite destruídos, prestes a esfoliar, mas que provocavam uma lesão extensa na língua. Não foi uma decisão difícil, em dez minutos cinco dentes foram extraídos e em três dias a lesão havia sumido. Se fiz um bem para a menina, ela não sabe o bem maior que fez para mim.  

Após esse evento fui convidado a participar do Grupo de Cuidados Paliativos do Sabará. O grupo é composto por profissionais da mais alta competência técnica e toda a equipe imbuída de um sentimento: melhorar a vida das crianças com quadro clínico crítico, confortá-las e as suas famílias. Fiquei emocionado, poucas vezes em minha vida profissional me sensibilizei tanto.

Posso dizer, sem receio de me sentir piegas, mas já vi muita coisa na Odontologia. Há mais de trinta anos cuidando de “crianças especiais”, minhas lembranças remontam a casos graves que saiam do ambulatório ou mesmo do centro cirúrgico, onde minha única opção era rezar, rezar e rezar. Você deve estar se perguntando; mas um tratamento odontológico traz risco de morte? Não se realizado dentro das normas corretas, mas… quem tem risco de morte é a vida. O imponderável corre muito ao lado quando cuidamos de crianças com quadros clínicos críticos, essa é uma realidade para quem cuida dos “especiais”. Porém, era em Deus que eu podia me apoiar e pedir um desfecho feliz para o caso. E Ele sempre dava um final feliz para mim e para “minha criança”.

Por isso sempre me senti calejado em cuidar de crianças com quadros clínicos complexos. Visitava meus pequenos pacientes na UTI e saia convicto de que aquela parada estava resolvida, havia dado o melhor de mim, e lá de cima o Pai me garantia. Contudo, ao acompanhar as crianças enquadradas nos “cuidados paliativos” confesso que baqueei. Me comovi a ponto de refletir mais sobre minha vida e os propósitos que tenho para ela.

Ao ver o trabalho do Grupo de Cuidados Paliativos, da abnegação das famílias envolvidas e sobretudo das crianças guerreiras, reconheço que o que fiz ainda é uma gota nesse oceano que é lutar pela vida. Talvez Deus tenha me colocado nessa empreitada para me mostrar que o caminho a ser trilhado, depois de tanto tempo trabalhando na Odontologia, ainda tem muito a ser percorrido, e mesmo que eu ainda não veja nenhuma luz no final, e nem sei se verei, quero aproveitar o caminho o máximo que puder.

Hoje vejo muito mais claramente que produzir sorrisos lindos e saudáveis é sensacional, mas nada se compara ao ato de confortar as famílias, melhorar a saúde geral das pessoas e principalmente não desistir do nosso bem maior que é a VIDA.

Para finalizar o último post do ano, gostaria de desejar a todos amigos um Natal maravilhoso, um 2018 que valha a pena ser vivido e lembrar as palavras do Gonzaguinha na canção: O que é, o que é?

“E a vida o que é, diga lá, meu irmão? Há quem fale que é um divino mistério profundo. É o sopro do Criador numa atitude repleta de amor. Somos nós que fazemos a vida, como der, ou puder, ou quiser. Sempre desejada, por mais que esteja errada, ninguém quer a morte, só saúde e sorte.” Por isso fico com a pureza da resposta das crianças: É a vida? É bonita e é bonita”  

Dr. José Luiz Setúbal

Dr. José Luiz Setúbal

(CRM-SP 42.740) Médico Pediatra formado na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, com especialização na Universidade de São Paulo (USP) e pós-graduação em Gestão na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Pai de Bia, Gá e Olavo. Avô de Tomás, David e Benjamim.

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