PESQUISAR

Sobre o Centro de Pesquisa
Sobre o Centro de Pesquisa
Residência Médica
Residência Médica
Novas tecnologias impulsionaram a medicina do sono
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Google Plus Compartilhar pelo WhatsApp
Novas tecnologias impulsionaram a medicina do sono

Novas tecnologias impulsionaram a medicina do sono

30/04/2025
  406   
  0
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Google Plus Compartilhar pelo WhatsApp

Palestrante do 7º Congresso Internacional Sabará-PENSI de Saúde Infantil, onde discorreu sobre investigação e intervenções em crianças com distúrbios do sono no Simpósio Desafios no Consultório, a dra. Rosana Cardoso Alves trabalhou no antigo endereço do hospital Sabará, nos anos 1990, fazendo avaliação em neurologia infantil no pronto-socorro e na UTI. Ao longo da carreira, ela acompanhou e participou dos principais avanços da medicina do sono, área em que se especializou. Foto: Rudah Poran/Galápagos

Neurologista infantil e neurofisiologista clínica, no início da carreira Rosana Cardoso Alves ignorou opiniões de colegas para se dedicar à área pela qual tem paixão: a medicina do sono. Quando começou a estudá-la, os próprios colegas da neurologia não davam a devida importância ao tema. Hoje, a maioria dos pediatras se interessa, pois sabe que uma boa higiene do sono impacta positivamente a imunidade das crianças. Com mestrado e doutorado em neurologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), a médica e pesquisadora foi orientadora do programa de pós-graduação do Departamento de Neurologia da mesma instituição. Atualmente uma das principais especialistas na medicina do sono no Brasil, ela já teve vários cargos na Associação Brasileira do Sono (ABS) e é ativa em outras sociedades médicas, como Associação Paulista de Pediatria. Sua prática e investigações na área clínica e a participação em pesquisas colaborativas a qualificam tanto para opinar em diretrizes médicas como para dar consultoria para startups na área de tecnologia envolvidas com wearables e aplicativos que monitoram o sono. Animada, depois de participar do 7º Congresso Internacional Sabará-PENSI de Saúde Infantil, nesta entrevista ela contou um pouco mais sobre o desenvolvimento e as atualidades da medicina do sono.

Notícias da Saúde Infantil –– Quando você se iniciou nessa área, a medicina do sono ainda não era uma área de atuação no Brasil. Conte um pouco sobre o desenvolvimento da área e quais foram os principais pontos de mudança. 

Rosana Cardoso Alves -– Foi muito gratificante participar do crescimento e desenvolvimento de uma área dentro da medicina. Há mais de 30 anos a parte clínica da medicina do sono estava embrionária ainda e eu já pesquisava o tema na minha graduação. Era uma novidade e mudou a prática médica. Não se dava importância ao sono e hoje se sabe que ele é importante para tudo. Eu vivenciei toda a mudança tecnológica, pois no início da carreira, nos anos 1980, a polissonografia, exame em que se acompanham oito horas de sono, gerava uma pilha de papel… a gente brincava que se matava uma árvore por exame. Imagina quanto era trabalhoso revisar todos os dados registrados. A partir dos anos 1990, os aparelhos viraram digitais, então ficava tudo gravado — foi um ganho de informações expressivo, além da sustentabilidade do processo, claro. Nos últimos dez anos avançamos por termos outros recursos além da polissonografia clássica. São aqueles aplicativos e wearables, em geral uma combinação entre smartphones e relógios de pulso, que já dão informações sobre o sono. Como tenho expertise no assunto, presto consultoria para startups nessa área, avaliando a efetividade de devices relacionados ao sono.

Notícias da Saúde Infantil –– E quais são os principais ganhos, para a prática médica, da análise com base nessas novas tecnologias?

Rosana Cardoso Alves -– Um dos mais positivos é que se ampliaram as informações para o diagnóstico. A polissonografia clássica, considerada padrão ouro em exames do sono, registra uma noite de sono, ou seja, funciona como uma foto desse período. Só que os transtornos do sono são dinâmicos; às vezes acontecem distúrbios em um dia e não no outro. Então, hoje, esses aplicativos e wearables têm a capacidade de medir a quantidade e a qualidade do sono por 30 noites seguidas… não é mais aquela foto estática. Nosso desafio, como médicos, é juntar todas as informações, de exames e devices, para diagnosticar e indicar o melhor tratamento. Outra mudança em que participei ativamente há 24 anos foi o início da polissonografia domiciliar, que no caso da criança é muito mais confortável. Isso só foi possível pelo desenvolvimento tecnológico, com aparelhos menores e mais transportáveis.

Notícias da Saúde Infantil –– Quais são os principais distúrbios do sono entre crianças e adolescentes que chegam ao consultório?

Rosana Cardoso Alves -– Em geral, são os temas da minha palestra no congresso: as parassonias, o terror noturno, o sonambulismo, sono agitado e os transtornos do despertar, que são fatores que, além de perturbar a criança, também incomodam e assustam a família. O sonambulismo exige medidas como trancar portas, isolar a cozinha, guardar itens que machucam, zelar pela segurança dos ambientes. Para exemplificar como essa ameaça é real, lembro do caso recente de uma menina de dez anos da Louisiana, nos Estados Unidos, que vagou para longe de casa e entrou em uma floresta densa durante um episódio de sonambulismo. Ela foi localizada com ajuda de um drone, que registrava imagens térmicas. Mas, em geral, crianças e adolescentes que roncam, que têm apneia do sono, com pausas respiratórias, não só assustam a família, mas trazem repercussões a longo prazo, afetando o crescimento e o desenvolvimento infantil.

Notícias da Saúde Infantil –– Quais os principais desafios dessa área que os pediatras enfrentam? Diagnóstico, recursos ou tratamentos?

Rosana Cardoso Alves -– Eu diria que são os três, numa sobreposição de fatores. Na consulta ao pediatra o tempo é curto e não dá tempo de investigar melhor a questão do sono. Pediatras mais atentos conseguem o diagnóstico adequado com ajuda de um questionário, além da avaliação clínica, e encaminham alguns pacientes para a polissonografia, mas o acesso ao exame muitas vezes depende de recursos. Quando se tem o diagnóstico, outro desafio é que o tratamento pode ser complexo, pois envolve mudança de hábito da família. Para tratar do sono da criança, todo mundo tem de estar  alinhado e colaborar, pois é preciso seguir rotinas regulares. Nas novas configurações familiares, onde não é raro um dia a criança dormir com a avó, outro na casa do pai ou da mãe, que estão separados… todos precisam estar cientes da intervenção com a criança e agir de maneira coordenada.

Notícias da Saúde Infantil –– Você escreveu quase 150 artigos científicos, sozinha ou em colaboração com outros pesquisadores. Como concilia a prática clínica com as observações de pesquisa e a atuação acadêmica?

Rosana Cardoso Alves –- Gosto muito desses papéis e para mim sempre foram atividades interligadas. Tenho meus grupos de pesquisa e, toda vez que pego um caso de difícil diagnóstico, peço a opinião e a ajuda de colegas, seja dentro da ABS ou na Academia Brasileira de Neurologia. Participo muito da construção de consensos de especialistas, sobre insônia, narcolepsia, laudo de sonografia. Esses protocolos facilitam muito a vida dos médicos, pois se espelham em diretrizes americanas e europeias. Gosto muito da parte de pesquisa e me considero apaixonada pela prática acadêmica. No dia a dia, tenho perfil mais acadêmico também para lidar com o paciente. Eu me considero uma médica-pesquisadora dos transtornos do sono.

Notícias da Saúde Infantil –– Um dos artigos em que participa –- na revista médica Sleep Medicine “Give children and adolescents the gift of a good night’s sleep: A call to action” –- defende uma boa noite de sono para crianças e adolescentes. Por que é necessária essa conscientização?

Rosana Cardoso Alves –- Esse é um paper liderado por uma colega americana, a dra. Jodi A Mindell, que nasceu durante um congresso. Ela trouxe uma preocupação por suspeitar que as crianças estão dormindo menos e quis saber se isso era verdade em outras partes do mundo. Fez uma pesquisa consultando colegas internacionais e reuniu em artigo, que levantou esse tema de saúde pública e teve muita repercussão. Sabemos que dormir menos e mal tem impacto negativo na saúde das crianças, então o mote da campanha é “Se você quer fazer algo em prol da saúde de seu filho, garanta uma boa noite de sono”. A iniciativa criou o site babysleep.com, que foi traduzido para o português e conta até com uma ferramenta que ajuda pais com recomendações para melhorar cinco áreas do sono: adormecer, rotinas de sono, duração do sono, despertar noturno e confiança no sono. Isso é bem relevante, pois não adianta só falar com os médicos; é preciso falar com o público, e com base em evidências científicas. Acho importante a orientação aos pais para que pesquisem em sites de sociedades médicas e com profissionais confiáveis, pois há todo tipo de influencers hoje em dia, com interesses e vieses. É essencial seguir com campanhas como a semana do sono, em março. Todo ano a Associação Brasileira do Sono é premiada por suas campanhas, focadas na conscientização para o tema. É apenas com informações que uma pessoa que sofre de distúrbios do sono há 20 anos, por exemplo, se dá conta de que pode ser um problema de saúde e que é tratável.

Notícias da Saúde Infantil –– A Associação Brasileira do Sono (ABS) reuniu especialistas em medicina do sono com o objetivo de desenvolver novas diretrizes no diagnóstico e tratamento das insônias. Como elas têm avançado no Brasil?

Rosana Cardoso Alves –- Nesse caso, passamos à conscientização dos médicos com ajuda dessas diretrizes. Assim como em outras especialidades, passamos por uma fase prescritora, em que se usava medicação excessiva. O Zolpidem foi uma medicação (para adultos) muito usada no início, mas hoje se sabe que tem efeitos colaterais e nem sempre funciona. Depois, passou-se a fazer terapia cognitiva-comportamental e outras opções de tratamento, com base em evidências científicas. Entre as problemáticas da área está a autoprescrição e o uso de medicações que criam dependência, por isso a importância dessas diretrizes.

Notícias da Saúde Infantil –– Quanto os pediatras conseguem dar conta das intervenções e quando é preciso recorrer a especialistas?

Rosana Cardoso Alves – A maioria dos pediatras está interessada no tema e aos poucos vai buscando mais informações. Mas, como as faculdades de medicina não dão formação específica para o sono, eles conseguem dar as primeiras orientações, mas, quando passa de dois ou três meses e a família está muito impactada, é sábio encaminhar para o especialista. Eu diria que um cuidado que o pediatra deve orientar é com o que chamamos de higiene do sono, que envolve a rotina da criança. Interessante relembrar que nos anos 1990, na Associação Paulista de Medicina, eu e mais dois colegas da neurologia, o dr. Luciano Ribeiro e o dr. Mauricio Bagnato, dávamos curso para estudantes de medicina e não vinha ninguém… não entendiam por que se davam aulas sobre insônia, apneia do sono, orientações sobre o tema. E hoje temos um congresso enorme sobre o sono, pois quando ele é insuficiente atrapalha em todas as áreas da saúde e precisa ser investigado. A má qualidade do sono aumenta a incidência de infarto e arritmia e causa distúrbios metabólicos, por exemplo.

Notícias da Saúde Infantil –– Quais são as linhas de pesquisa mais atuais que estudam o sono?

Rosana Cardoso Alves –- Uma linha de pesquisa enorme atualmente busca descobrir como as telas e as redes sociais afetam os neurotransmissores. Ela investiga o uso de jogos digitais por adolescentes, a exposição excessiva às telas. É uma preocupação em especial com o cérebro em desenvolvimento, porque o do adulto já está formado, mas no caso da criança e do adolescente não se sabe ainda como funcionam esses estímulos. Recentemente, a Meta e o Instagram foram obrigados a frisar que o uso excessivo dessas redes pode afetar a saúde mental, no mesmo tipo de recomendação que vemos em embalagens de cigarro. Sabemos que a exposição às telas afeta o sono, atrapalha seu início, deixa a criança mais ansiosa, mas será preciso estudar seus impactos a longo prazo. Foi impressionante o avanço da nossa compreensão sobre o funcionamento do cérebro nos últimos 30 anos, e mesmo assim ainda o entendemos de forma parcial, por isso essa área é fascinante e perfeita para quem, como eu, gosta de estudar eternamente.

Por Rede Galápagos

Leia mais

Infância e emoções: um alerta sobre o bem-estar de nossas crianças e adolescentes

Atenção para a autolesão não suicida em crianças e adolescentes

Saúde mental e inclusão

Saúde infantil como prioridade

Pesquisa e ensino conectados

PENSI E SAS NA EXPEDIÇÃO SERTÕES Um marco no cuidado pediátrico e na formação médica

PRECEPTORAS FALAM DA EXPEDIÇÃO Mergulho na saúde do Brasil profundo

A EXPERIÊNCIA DOS MÉDICOS RESIDENTES A 3 mil quilômetros da Avenida Angélica

Intervenções personalizadas no autismo

“É preciso garantir que meninos e meninas tenham, de fato, seus direitos respeitados”

Avanços no tratamento intensivo infantil

Presente e futuro da inteligência artificial para a saúde infantil

Histórias que moldaram a pediatria e a nutrição

Emergência climática, o desafio de todos

Simpósio destacou palestras sobre choque séptico, monitorização neurológica e a história da UTI pediátrica no Brasil

Aprendizado, atualização e troca de conhecimento em pediatria

Cuidado humanizado com foco na criança e sua família

UTI pediátrica: inovação para enfrentar desafios

Com carinho, conforto e conversa, programa muda vida de pacientes com questões sensoriais

Comunicação PENSI

Comunicação PENSI

deixe uma mensagem O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

posts relacionados

INICIATIVAS DA FUNDAÇÃO JOSÉ LUIZ EGYDIO SETÚBAL
Sabará Hospital Infantil
Pensi Pesquisa e Ensino em Saúde Infantil
Autismo e Realidade

    Cadastre-se na nossa newsletter

    Cadastre-se abaixo para receber nossas comunicações. Você pode se descadastrar a qualquer momento.

    Ao informar meus dados, eu concordo com a Política de Privacidade de Instituto PENSI.