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A discussão sobre os desafios do diagnóstico e da intervenção precoce em casos de TEA (Transtorno do Espectro Autista) permeou a primeira mesa do Simpósio de Crianças com Necessidades Específicas (Transtorno do Espectro Autista + Síndrome de Down), com o tema Diagnósticos e Encaminhamentos, realizada na manhã deste sábado (21), terceiro e último dia do 5º Congresso Internacional Sabará de Saúde infantil.
Avaliação Multidisciplinar: Perspectivas e Trajetórias, traçando um panorama geral de diagnósticos e tratamentos do TEA em crianças e adultos, foi apresentado pela neuropsicóloga Joana Portolese, coordenadora do Protea (Programa do Transtorno do Espectro Autista) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e assessora em neuropsicologia do Instituto PENSI e do Sabará Hospital Infantil.
Portolese afirmou que é possível diagnosticar crianças com TEA partir dos 16 meses, mas a idade média em que acontece é em torno de 4 anos. Nas crianças que possuem TDAH, o TEA costuma levar mais tempo para ser diagnosticado – entre 6 e 7 anos.
Um dos destaques da fala de Portolese é a importância que o apoio familiar e comunitário têm para os pacientes. O isolamento e a falta de contato social são elementos mais estressores do que os próprios sintomas de TEA.
Entre os desafios para identificar o autismo estão as múltiplas manifestações do transtorno. “Um desafio para a prática é o conhecimento dessa heterogeneidade”, daí a importância, diz ela, de ONGs apoiadas por pais e de empresas voltadas à diversidade.As informações sobre diferentes trajetórias do desenvolvimento do autismo podem ajudar a identificar mudanças tanto em grupo de autista ou de risco, e permitir observações e intervenções mais acuradas.
Em seguida, a psiquiatra da infância e adolescência Marina Fontello, colaboradora do Protea palestrou sobre Diagnóstico Diferencial e Comorbidades em TEA.
Fontello destacou o aumento da prevalência da doença de acordo com os dados do CDC (Centro de Controle de Doenças e Prevenção do governo dos EUA). A prevalência passou de um a cada mil em 1989 para 1 a cada 54 no levantamento deste ano. O aumento pode ter sido provocado tanto por alterações ambientais capazes de promover modificações genéticas, como por aumento das suspeitas dos pediatras e pela maior veiculação de informações sobre o transtorno na população geral. Além disso, tipos diferentes de medidas de diagnóstico e a mudança de nomenclatura, com a visão de TEA como espectro, também influenciaram o crescimento.
A especialista citou ainda uma série de diagnósticos que precisam ser levados em conta na tentativa de investigar a hipótese de TEA, entre eles os transtornos ansiosos, o TDAH e o distúrbio específico de linguagem. Ela citou as principais ferramentas diagnósticas atuais, como ADI-R e ADOS e seus limites, como a dificuldade de detectar o transtorno entre meninas.
Em seguida, o psiquiatra da infância e adolescência e colaborador do Protea Fernando Sumiya falou sobre O Uso da Tecnologia no Diagnóstico Precoce de TEA. Sumiya destacou as pesquisas realizadas com eye tracking (rastreamento ocular), eletroencefalograma e ressonância para identificação de autismo. Sumiya deixa claro que ainda não é possível contar com esses exames e que apenas pesquisas estão andamento.
Ele citou como exemplo um estudo que avaliou o sono de bebês de 6 meses por meio de ressonância magnética funcional e puderam diferenciar crianças com e sem TEA. Um outro exemplo são estudos que usam eye tracking que indicam a dificuldade de autistas de focarem o olhar em direção ao interlocutor.
Por meio da relação entre eletroencefalograma e eye tracking também é possível avaliar crianças com até 3 meses e definir se há baixo ou alto risco ou se ela não tem TEA.
Mediador da mesa, o médico neurorradiologista Edson Amaro, coordenador do núcleo de neurodesenvolvimento do Instituto PENSI, questionou sobre as possibilidade de diagnóstico pelo SUS tanto por meio de observações clínicas quanto pela aplicação de tecnologias. Sumiya esclarece que o processo de aplicação tecnológica ainda é inicial, restrito a pesquisas e não há previsão para popularização ou utilização pelos serviços públicos de saúde. Fontello destacou que ainda é necessária a criação de instrumentos para cada situação particular observada no autismo, como por exemplo, nos casos de TEA dentro da Síndrome de Down – que têm particularidades em relação ao TEA dentro de outras síndromes. Portolese citou a importância de ambulatórios de referência, como o Protea, e da popularização do conhecimento. Segundo ela, no sistema público há uma espera de um mês e meio por exemplo para marcação de consultas e para o trabalho de intervenção a realidade ainda é mais complicada, apesar de avanços recentes. “De 2008 pra cá, a gente caminhou muito oferecendo mais serviços mas a gente ainda tem muito para avançar, não só em termos de pesquisa mas também de assistência.
Também mediador, Lino de Macedo, assessor do Instituto PENSI e da Fundação José Luiz Egydio Setubal (FJLES), trouxe uma provocação a respeito da resposta que deve ser dadas a pais e professores aflitos por filhos e alunos com problema relacionados ao TEA, que “querem uma ajuda que nem sempre é fácil, barata, possível e imediata”.A orientação de Portolese é estimular a criança, procurar a UBS (Unidade Básica de Saúde), procurar a intervenção com o método ABA e buscar sites de referência como o do projeto Autismo e Realidade (https://autismoerealidade.org.br/). “A hora que a gente observa que a criança fica mais isolada, tem dificuldade de comunicação social, ausência da fala, não aponta, fica mais irritada, brinca de maneira repetitiva, é muito importante conversar com os pais, estimular essa criança porque geralmente a gente não costuma estimular”, diz a especialista.