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Num discurso na 46ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), a Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, disse à comunidade internacional que “o Brasil continua firme na defesa da democracia, da liberdade, da família e da vida a partir da concepção”.
Em seguida, o Brasil se recusou a aderir a uma declaração conjunta realizada por mais de 60 países para defender o direito de meninas e mulheres, inclusive no que se refere ao acesso a direitos reprodutivos e sexuais. Desde o final do governo de Donald Trump, o Brasil assumiu de uma maneira informal a liderança de uma coalizão de países ultraconservadores que tentam minar qualquer brecha para que a ONU amplie direitos e proteções às mulheres. O grupo, conhecido como Consenso de Genebra, ainda inclui Hungria, Polônia e países árabes.
Nossa ministra, por razões ideológicas, parece esquecer nossos indicadores de crianças que são estupradas e engravidadas todos os anos por todo o país. Vamos voltar a colocar os números aterradores para ver se seu Ministério faz alguma coisa. É preciso ressaltar que a prática é considerada internacionalmente uma violação dos direitos humanos (segundo o ODS 5, da Agenda 2030 da ONU), está diretamente associada à gravidez precoce e suas consequências são múltiplos riscos às jovens mães.
A taxa de gestação na adolescência no Brasil é alta, com 400 mil casos/ano. Quanto à faixa etária, os dados revelam que em 2014 nasceram 28.244 filhos de meninas entre 10 e 14 anos e 534.364 crianças de mães com idade entre 15 e 19 anos. Esses dados são significativos e requerem medidas urgentes.
Diversos fatores concorrem para a gestação na adolescência. No entanto, a desinformação sobre sexualidade e direitos sexuais e reprodutivos é o principal motivo. Questões emocionais, psicossociais e contextuais também contribuem, inclusive para a falta de acesso à proteção social e ao sistema de saúde, englobando o uso inadequado de contraceptivos.
O Atlas da Violência fez um estudo detalhado da violência sexual contra a mulher e aponta que, em cinco anos, o número de registros de estupro no sistema de saúde dobrou e que quase 51% dos casos ocorridos em 2016 tinham como vítimas meninas com menos de 13 anos de idade. Enquanto em 30% desses casos, o agressor é amigo ou conhecido da criança, em outros 30% o agressor é um familiar próximo, como pai, padrasto, irmão ou mãe. E, quando o agressor é alguém conhecido, a violência sexual ocorre dentro da própria casa da vítima em 78% dos casos.
São dados aterradores e chocantes, e parece que nós estamos dessensibilizados em relação a isso. Nossas autoridades não parecem estar preocupadas, nossa sociedade só se mobiliza quando morre alguém famoso como a Marielle Franco ou quando um bebê morre por bala perdida.
O ECA é importante, é um sucesso em muitas coisas, mas as crianças e jovens do Brasil ainda são vítimas de muitos abusos de várias ordens e, para isso, Fundações como a nossa precisam mobilizar a sociedade civil organizada para proteger essa população vulnerável e continuar esta luta. Não podemos esquecer do nosso propósito: Infância saudável para uma sociedade melhor.
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Atualizado em 20 de fevereiro de 2025